Atualmente, a produção de aves e suínos tem encontrado dificuldade em estabilizar os custos de produção devido a constantes altas de preços em praticamente todos os ingredientes, incluindo o milho e o farelo de soja.
A alimentação representa a maior parcela dos custos de produção na criação avícola e por isso a utilização de alimentos alternativos de qualidade e de composições conhecidas para formulação de rações de custo mínimo possibilitam uma adequação econômica mais conveniente ao produtor (RODRIGUES et al., 2008).
Quando pensamos em diversificar o uso de ingredientes para aves, é sempre importante estar atento a parâmetros como a disponibilidade comercial, os preços relativos aos ingredientes tradicionais, e principalmente, a qualidade da matéria-prima. Lembrando que, a alimentação constitui um dos fatores de maior relevância na exploração avícola, pois uma dieta adequada pode promover melhoria tanto na produtividade quanto no rendimento de carcaça (SOUZA et al., 2008).
A busca por alimentos não usual deve estar sempre acompanhada de avaliações nutricionais a fim de conhecer a composição bromatológica, reações fisiológicas provocadas pelo alimento ao animal, digestibilidade do alimento, limites de inclusões práticas, entre outros.
Prado et al. (2000) afirmam que existe uma variedade de alimentos e resíduos da agroindústria que podem ser usados na alimentação de animais e seu valor nutricional é determinado por complexa interação de seus constituintes e pela interação com os microrganismos do trato digestivo, nos processos de digestão e absorção, no transporte e na utilização dos metabólitos, além da própria condição fisiológica do animal.
Coprodutos agroindustriais
Um exemplo de alternativos que pode ser usado na alimentação das aves está no uso de coprodutos agroindustriais. Os grãos secos de destilaria com solúveis (DDGS) pode se tornar uma oportunidade viável além de ser um produto sustentável, por ter origem na produção de biocombustíveis.
Por outro lado, devido a variabilidade de sua composição nutricional, seu uso em dietas de aves deve ser feito com cuidado, reduzindo possíveis quedas no desempenho zootécnico. É importante ressaltar, a importância de frequentes análises nutricionais e balanceamento das formulações, uma vez que, sua composição nutricional pode variar, sendo essa possibilidade maior para coprodutos do que para os alimentos convencionais. Trata-se de um coproduto de alto teor de fibra e a grande variabilidade no perfil de aminoácidos.
Subprodutos de origem animal
Semelhante aos coprodutos, ingredientes como as farinhas de origem animal, podem sofrer variações na sua composição e consequentemente no seu perfil nutricional em função da matéria-prima utilizada e do processamento empregado, e, quando associados ao uso de dados errados de disponibilidade de aminoácidos, podem acarretar prejuízos no desempenho das aves (Rostagno et al., 1995).
Entretanto, subprodutos de origem animal com um bom controle de processamento e livre de contaminações microbiológicas são bastante utilizados em dietas de aves como fonte alternativa de proteínas, mas sempre é preciso atentar-se em conhecer sua verdadeira composição nutricional assim como seguir os níveis máximos de inclusão recomendados.
Vale ressaltar a importância do uso de dietas formuladas com base em proteína ideal e aminoácidos digestíveis a fim de fornecer todos os nutrientes exigidos para o desenvolvimento do animal. Além disso, para a utilização de ingredientes de origem animal é de fundamental importância um acompanhamento de sua qualidade com procedimentos que envolvam controle de processos oxidativos como rancidez, acidez e peróxidos e outras possíveis contaminações microbiológicas.
Demais alternativos
Muitas culturas estão sendo cada vez mais estudadas para serem utilizados na alimentação das aves em substituição ao milho e a soja, como o arroz, trigo, aveia, seus derivados, entre outros. Neste artigo vamos abordar as seguintes culturas: milheto, sorgo, triticale e trigo grão.
Milheto
Podemos considerar o milheto como um ingrediente passível de ser usado na alimentação animal como ingrediente energético.
Na forma de grãos e comparativamente ao sorgo e ao trigo, o seu conteúdo energético para aves é semelhante. Porém, quando comparado ao milho, apresenta-se com valor energético inferior. O seu conteúdo em proteína e sua composição em aminoácidos essenciais são superiores tanto ao milho quanto ao sorgo. (Butolo, 2010).
A inclusão de milheto em dietas animais apresenta ainda como vantagem a menor susceptibilidade à ocorrência de fungos, diminuindo assim a incidência de problemas como micotoxinas (Bandyopadhyay et al., 2007), e em relação a outros cereais, não possuir fatores antinutricionais, que interferem na digestibilidade, absorção e utilização dos nutrientes.
Sorgo
O sorgo possui características nutritivas semelhantes às do milho. Seu valor energético é ligeiramente inferior, porém possui níveis mais altos de proteína em relação ao milho. Entretanto, o milho contém níveis superiores de aminoácidos essenciais como a lisina e metionina.
Um ponto que deve ser levado em consideração na utilização do sorgo, é que ele possui baixo teor de xantofila e caroteno, que são responsáveis pela pigmentação na pele dos frangos e na gema do ovo, características importantes na preferência do consumidor, embora sem valor nutritivo.
É importante ressaltar também que o sorgo pode conter elevado teor em taninos em alguns cultivares. A presença de taninos nos alimentos tem alguns efeitos detrimentais na saúde e no desenvolvimento animal, incluindo depressão na palatabilidade do alimento, na ingestão voluntária, na digestibilidade das proteínas, dos carboidratos, do amido e de lipídios e diminuição na absorção do cálcio (CHANG et al, 1994). Dessa forma, é importante certificar-se quanto à presença ou não de tanino através de análise laboratorial.
Triticale
O triticale é um cereal híbrido, resultado do cruzamento de duas espécies distintas, o trigo e o centeio.
Quando comprado ao milho e ao sorgo, podemos observar que o triticale possui teor proteico e de fibra bruta mais alto e um extrato etéreo mais baixo, sendo também seu balanço de aminoácidos mais favorável.
Quanto ao ponto de atenção na utilização do triticale, é que alguns cultivares podem conter inibidores de tripsina e quimotripsina, que são fatores antinutricionais que podem limitar seu uso em rações de monogástricos. (Butolo, 2010).
Trigo grão e triguilho
O uso do trigo grão inteiro ou moído é mais uma ferramenta na busca de diversificação para redução dos custos da ração, trata-se de um cereal de inverno bastante difundido na Europa.
Para as aves, o trigo possui um maior percentual de proteína quando comparado ao milho, porém apresenta cerca de 10% menos energia, podendo ser uma alternativa para substituí-lo na dieta de forma limitada principalmente devido sua alta concentração de fibra.
ANNISON e CHOCT (1991) citam que a presença de polissacarídeos não-amiláceos na parede celular de cereais como trigo, cevada, centeio e triticale influenciam negativamente o aproveitamento da energia, aumentando a retenção de água no intestino e, como consequência, a viscosidade do conteúdo intestinal. As aves não produzem quantidade suficientes das enzimas xilanases e os polímeros formados aumentam a viscosidade da digesta. Portanto, é preciso limitar a inclusão de trigo na dieta ou utilizar enzimas exógenas como as carboidrases.
Já o triguilho é constituído de grãos de trigo de boa qualidade, porém de tamanho menor que o grão comum. Em relação ao milho, apresenta valores mais elevados de proteína bruta, cálcio, fósforo, fibra bruta e aminoácidos. A limitação para o uso de maiores níveis de triguilho em substituição ao milho se deve ao menor valor de energia metabolizável. (Embrapa, 2005)
Enzimas
Não podemos falar em redução de custos de produção sem lembrar que diversos trabalhos de pesquisas estão focados em aditivos como as enzimas e outros conceitos inovadores.
Os efeitos dietéticos das enzimas exógenas estão associados ao aumento da digestão de produtos de baixa qualidade e redução da perda de nutrientes nas fezes, sendo assim possível reduzir os níveis nutricionais da dieta com possíveis vantagens econômicas. Para tal, uma variedade de carboidrases, proteases e fitases são utilizadas para estes fins (McCleary, 2001).
Muitos ingredientes alternativos apresentam restrições quanto ao seu uso na formulação das dietas para aves, por conterem fatores antinutricionais, que prejudicam o desempenho, e consequentemente, resultam em baixa uniformidade e lucratividade ao final da produção. O uso de enzimas permite que tais ingredientes sejam utilizados de maneira tão eficiente quanto o são o milho e a soja (Campestrini et al., 2005).
Para finalizar, é importante relembrar que uma nutrição adequada pode promover melhoria no desempenho e produtividade das aves. A dieta representa também cerca de 80% do custo de produção. Dessa forma, torna-se necessário diversificar o uso de ingredientes nas dietas que supram as necessidades dos animais, que sejam produzidos em quantidades suficientes a demanda e que tenham melhores preço quando comparado ao milho e a soja.
Alguns cultivares, considerados como alternativos ao milho e a soja no Brasil, são amplamente utilizados em outros países, principalmente na Europa. Com o aumento dos preços do milho e soja principalmente, o interesse por outras culturas nesse momento é maior, porém ainda são muito regionalizadas. Atualmente um dos principais limitantes para o uso de muitos desses ingredientes alternativos é a disponibilidade.
De qualquer forma, a busca de ingredientes alternativos ao milho e a soja deve ser feita com cuidado, conhecendo em detalhes a digestibilidade do alimento, sua composição bromatológica, além de entender e controlar possíveis fatores antinutricionais que possam dificultar a digestibilidade e a absorção de nutrientes.
Fonte: Renata Soares Marangoni é zootecnista com especialização em Gestão de Produção, mestrado em Produção e Nutrição Animal e nutricionista de Aves da De Heus do Brasil.
Referências:
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