João Paulo Monteiro, Revista Feed&Food nº 201
Em uma floresta, o equilíbrio é a essência da vida. Cada árvore, cada animal, cada microrganismo desempenha um papel vital nesse ecossistema. Assim como uma sinfonia, onde cada instrumento contribui para a melodia geral, na natureza, cada elemento colabora com o todo.
Essas analogias nos apresentam o conceito da interdependência. Nos exemplos, qualquer desequilíbrio pode reverberar em todo o sistema; e assim também se dá no agronegócio.
No setor, a relação entre produtores, meio ambiente, cadeias de suprimentos e consumidores é fundamental, pois cada elo desse complexo sistema impacta no sucesso do conjunto.
Dentro desse contexto, a compreensão da importância de cada componente, seja na floresta, em uma orquestra ou no agro, é indispensável para a perenidade das atividades.
No ambiente produtivo, é preciso considerar, além das relações comerciais, as questões naturais. Ou seja, o sucesso de um negócio vai além dos termos financeiros.
Aspectos sociais e também ambientais contam; e muito. Esse é o escopo do ESG. O conceito surgiu como uma evolução natural da forma de pensar e de fazer negócios a partir do tradicional tripé da sustentabilidade.
A rentabilidade do negócio deve ser consequência de práticas amigáveis ao planeta e conquistada dentro de uma estrutura de governança responsável. “Não se trata de lucro a qualquer custo”, determina Thomas Eckschmidt. “Isso não é mais aceitável”.
OLHAR SISTÊMICO E TRABALHO EM CONJUNTO. Cofundador do movimento Capitalismo Consciente no Brasil e empresário com experiência em multinacionais em diversos países, Thomas Eckschmidt também já foi produtor de leite e traz uma perspectiva coletiva para o campo. “Atualmente me dedico ao desenvolvimento da consciência da gestão junto a lideranças, ou então, como melhorar a forma de operar das organizações”, acrescenta.
Como esclarece Eckschmidt, o comprometimento com práticas ambientais, sociais e de governança – ESG – não é uma novidade no setor agropecuário brasileiro, mesmo antes de receber esse nome.
O produtor consciente não mais ateia fogo para reformar as pastagens. A nova cultura é semeada diretamente sobre a palha ou resíduos da colheita anterior, preservando a estrutura do solo e contribuindo para a redução da erosão. Essa prática, o plantio direto, é apenas um exemplo de evolução do setor em direção a práticas mais responsáveis e sustentáveis.
O agro brasileiro tem no meio ambiente sua principal infraestrutura, por isso a conscientização e as práticas sustentáveis não são uma reflexão tardia; mas, sim, elementos intrínsecos à sua essência.
“Enquanto outras indústrias começam a abraçar o ESG, o agro já trilha esse caminho há anos, sendo pioneiro na busca por práticas sustentáveis e responsáveis”, analisa Eckschmidt.
O setor já reconhece como a jornada não se encerra em uma mera transação de compra e venda. No caso do boi, por exemplo, é imprescindível saber todas as informações de origem e, para vender, é preciso engordar o animal e atingir as condições necessárias. Essa rede de interações exige uma abordagem sistêmica.
Ou seja, é importante ir além da visão linear, de ações isoladas. “Precisamos pensar como um sistema”, orienta Eckschmidt, que destaca a necessidade de enxergar além da competição direta e cultivar uma mentalidade de colaboração e integração.
Na prática, cada profissional da cadeia produtiva deve deixar para trás a mentalidade de um simples executor de tarefas e assumir uma postura atenta aos impactos de cada ação. “Todos devem entender a consequência daquilo que está sendo feito e ir além do curto prazo, adotando uma perspectiva de médio e longo prazo e assim se preparar para fazer aquela tarefa render mais”, explica.
Isso porque não há área para expandir a produção. É determinante, portanto, produzir melhor.
Esse pensamento se alinha aos três níveis da segurança alimentar. O primeiro é a garantia de alimento para todos; o segundo se relaciona à segurança dos alimentos. Já o terceiro, elenca Eckschmidt, trata-se das técnicas produtivas utilizadas. “É preciso produzir hoje, mas também garantir a produção de amanhã”, confirma e completa: “Esse nível de consciência somente ocorre quando todos trabalhamos juntos, de forma colaborativa”.
Sustentabilidade, portanto, é ser capaz de suprir as necessidades do presente sem comprometer as próximas gerações. E a importância de “jogar junto” já é bem percebida por boa parte da iniciativa privada, visualiza Eckschmidt. E o motivo é claro: “Hoje, nenhum produtor quer receber um vendedor”.
Na realidade, é clara uma resistência à abordagem tradicional. O que isso significa? O especialista explica: “Não se trata de vender. É preciso ensinar”.
“Entenda que sua empresa é um negócio de educação, porque o produtor tem vontade de aprender; e, ao contrário, ele não tem vontade de encontrar vendedor. Então, se você for ensinar, ele estará de ouvidos abertos e, se você conseguir mostrar que o que você ensina é melhor com o seu produto ou seu serviço, provavelmente você conquistará um consumidor”, destaca.
Essa visão é fundamental para fortalecer o ecossistema local visando competir globalmente. E a chave para essa transformação reside na “coopetição”, uma fusão de cooperação e competição.
Esse pensamento busca mostrar ao setor a real competição nesse mercado. “Os produtores brasileiros concorrem não com seus vizinhos, mas com os Estados Unidos, com a Índia, com a África, ou seja, com outros países”, indica Eckschmidt.
Portanto, em meio aos desafios contemporâneos do agronegócio, Thomas Eckschmidt sugere uma nova forma de pensar: “O nosso desafio hoje não é produzir mais, mas, sim, produzir melhor. E o único jeito de produzir melhor é produzir junto, pois o nosso concorrente não está no vizinho; ele está em outro país”.
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