ARTIGO

Conteúdo

O que falta para o Brasil liderar a produção de proteína animal sustentável?

Simpósio Internacional Produtor do Bem reuniu especialistas no assunto
feedfood
Natalia Ponse, de São Paulo (SP) | natalia@dc7comunica.com.br

A sustentabilidade é uma questão de importância crescente, principalmente no agronegócio, refletindo a necessidade de equilibrar a produção de alimentos com a preservação do meio ambiente e o bem-estar social. Em um mundo onde a demanda por alimentos continua a aumentar, o Brasil, como o grande celeiro do mundo e um dos maiores produtores de proteína animal, está na vanguarda desse movimento.

A promoção de práticas sustentáveis não apenas assegura a viabilidade a longo prazo das atividades agrícolas, mas também melhora a imagem do setor no cenário global, atendendo às expectativas de consumidores cada vez mais conscientes. Em São Paulo (SP), a Produtor do Bem (social-startup dedicada à certificação de sistemas de produção de alimentos) norteou um rico debate nesse sentido com o Simpósio Internacional “Brasil: Rumo à liderança global em proteína animal sustentável – Onde estamos e para onde vamos?”.

O encontro reuniu especialistas, na terça-feira (11), no prédio do Senai Biotecnologia, para disseminar informações relevantes ao mercado e à iniciativa privada, permitindo que todos os envolvidos na cadeia produtiva compreendam e adotem práticas que promovam a sustentabilidade e a responsabilidade socioambiental.

José Ciocca mediou o simpósio realizado em São Paulo (SP) (Foto: Divulgação/Noelly Castro)

José Ciocca, CEO da Produtor do Bem, destacou a importância de unir diferentes frentes do setor em prol de um único objetivo: “É hora de falarmos sobre liderança global e sustentabilidade, temas que remetem diretamente à importância do trabalho em conjunto. Este trabalho exige atenção redobrada ao bem-estar animal, que não é algo independente ou isolado, e sim uma das forças motoras do nosso trabalho dentro e fora do Brasil”.

A coordenadora de Relacionamento com a Indústria do Senai Biotecnologia, complementou: “Fomentar ações como essa é importante para que nossos alunos possam entender o que o mercado está requerendo. Os temas tratados aqui refletem o que o público mais jovem trabalhará no futuro próximo”.

O papel da ciência e tecnologia na sustentabilidade brasileira

Durante o evento, Andréa Figueiredo, representante da Coordenação Geral de Sustentabilidade e Regulação do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), discutiu como o Brasil construiu seu modelo sustentável, ressaltando a importância da ciência e tecnologia nesse processo. “Conseguimos construir isso com base em muita ciência e tecnologia. Houve um aprofundamento e conhecimento do nosso sistema de produção tropical”, explicou Andréa.

Ela destacou a adaptação do Brasil a seus solos ácidos e pouco férteis através do uso de fertilizantes, defensivos e outras substâncias para transformá-los em solos produtivos. “Aprendemos a corrigir os solos, utilizando fertilizantes, defensivos e outras substâncias para transformá-los em solos produtivos”, afirmou. Além disso, técnicas como o melhoramento genético animal e vegetal, os organismos geneticamente modificados (OGMs), edições gênicas e sequenciamento genético digital foram fundamentais para esse aumento de produtividade.

Andréa Figueiredo ressaltou a importância da dominação de técnicas de produção de alimentos em clima tropical como diferencial global (Foto: Divulgação/Noelly Castro)

Andréa também mencionou a importância dos sistemas integrados de produção, como lavoura-pecuária-floresta, que aumentam a produtividade, proporcionam maior conforto aos animais e diversificam as fontes de renda ao longo do ano. “Esses sistemas proporcionam maior conforto aos animais e geram maior renda ao produtor, ao diversificar as fontes de renda ao longo do ano”, acrescentou.

Ela enfatizou que o bem-estar animal deve estar presente na rotina dos sistemas produtivos, atendendo às expectativas de uma sociedade cada vez mais informada. “O consumidor quer produtos obtidos de forma ética, de empresas que respeitam seus funcionários e não utilizam trabalho infantil ou escravo”, destacou.

A importância dos relatórios de sustentabilidade

Andrea Pradilla, diretora da Global Reporting Initiative (GRI) para a América Latina, destacou a importância dos relatórios de sustentabilidade. “O desastre ambiental envolvendo derramamento de óleo no Exxon Valdez, no Alasca, levou a uma discussão sobre a necessidade de informações mais claras e precisas de empresas, investidores, sociedade civil e acadêmicos para prever e evitar riscos semelhantes”, explicou Andrea, .

A GRI é uma organização internacional que tem como objetivo ajudar empresas, governos e instituições a comunicar e divulgar o impacto de suas ações e negócios no setor sustentável de modo geral. A divulgação dessas atividades é feita através de um relatório de sustentabilidade, que é uma ferramenta utilizada pelas organizações para desenvolver uma estratégia de gestão voltada para os indicadores socioambientais e econômicos.

Realizar o acompanhamento dos padrões de sustentabilidade deve ser um compromisso anual nas empresas, assim como é o relatório contábil, indica Andrea Pradilla (Foto: Divulgação/Noelly Castro)

Andrea enfatizou que os padrões do GRI são de acesso gratuito e disponíveis em português. “Nós estabelecemos o padrão, mas não supervisionamos. Não somos uma organização de certificação. A responsabilidade de avaliar se uma empresa está cumprindo bem o padrão recai sobre seus stakeholders”, esclareceu.

Ela também destacou a importância de considerar a visão de múltiplos stakeholders para abordar verdadeiramente o desenvolvimento sustentável. “A comunidade de investidores e o setor bancário estão se interessando mais por sustentabilidade, mas isso não significa que tenham todas as respostas. É necessário um enfoque multistakeholder e seguir um padrão internacional para garantir uma abordagem equilibrada e completa”, disse.

Desafios e oportunidades para a ciência brasileira

Adroaldo Zanella, professor doutor da Universidade de São Paulo (USP), trouxe uma visão crítica sobre a ciência brasileira na área de bem-estar animal. Ele destacou que, embora a ciência brasileira seja uma das melhores do mundo, ainda há muito espaço para crescimento, especialmente em termos de investimento e recursos. “Eu sou apaixonado pela ciência fundamental, mas percebi que não estamos conversando com os produtores. E isso me envergonha, pois sou filho e neto de produtores,” confessou Zanella.

Ele enfatizou a necessidade de mudar o discurso e estabelecer um diálogo contínuo com os produtores para promover a sustentabilidade. “Precisamos fazer com que a sustentabilidade faça sentido para o produtor. Caso contrário, não teremos sucesso,” afirmou.

Adroaldo Zanella reforça: é preciso manter a conexão e a comunicação com o produtor na hora de estabelecer metas e técnicas referentes à sustentabilidade (Foto: Divulgação/Noelly Castro)

Zanella também abordou a questão do êxodo rural, destacando que o campo está se tornando cada vez menos atrativo, especialmente para mulheres jovens. “Estamos enfrentando uma crise de sustentabilidade muito séria no campo. As mulheres estão deixando o campo, e isso representa uma perda significativa para a sustentabilidade,” observou.

Ele compartilhou uma experiência colaborativa com a Polícia Militar Rodoviária do Estado de São Paulo, onde trabalharam juntos para inspecionar caminhões e identificar problemas no transporte de animais. “Essas iniciativas são únicas e mostram a importância da sinergia entre diferentes setores,” afirmou.

LEIA TAMBÉM:

Avicultura do RS tem impactos avaliados

Carne suína brasileira registra crescimento nas exportações

Brasil expande exportações de aves vivas para Lesoto