Natália Ponse, da redação
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O retrato da produção de suínos no Brasil tem como base a transmissão de ensinamentos entre pais e filhos em todo o território verde e amarelo. São lições, vivências e padrões que se estendem e perduram pelo tempo, solo que faz crescer produtividade e dedicação das mãos do suinocultor. Essas pessoas fazem parte do time que transforma o agronegócio na principal força econômica brasileira.
Essa característica se mostra inclusive em tempos de instabilidade. O agro continua sendo a base fundamental para que os números não despenquem. A suinocultura, por exemplo, coloca-se como um dos agentes geradores de empregos: o último levantamento do setor, publicado no Mapeamento da Suinocultura Brasileira divulgado em novembro de 2016, aponta que esta atividade é responsável diretamente pela colocação de aproximadamente 126 mil pessoas no mercado de trabalho, proporcionando massa salarial de R$ 3.339,7 milhões em 2015. Com relação aos empregos indiretos, a atividade gerou 923.394 mil vagas, ou seja, sete colocações indiretas para cada direta formalizada.
Com PIB de US$ 18 milhões e faturamento de quase USS 45 milhões, a suinocultura brasileira reúne mais de um milhão de matrizes, com abate de 39 milhões de animais. Para representar esse poderio numérico existe a Associação Brasileira dos Criadores de Suínos (Brasília/DF). O diretor-executivo da entidade, Nilo de Sá, salienta a posição estratégica da sede, na capital política brasileira. “Conseguimos assinar termos de cooperação com o ministério da agricultura, estamos envolvidos em toda importação de reprodutores e conquistamos a criação da Frente Parlamentar da Suinocultura, especificamente para tratar assuntos da cadeia”, enumera.
Outro triunfo da atividade é a Lei de Integração, sancionada em maio do ano passado. “40% da produção brasileira é feita nesse regime, e não havia um marco legal para reger esses contratos, todos ficaram em um ‘limbo legal’”, comenta de Sá, salientando também o trabalho realizado por meio da campanha de marketing “Escolha + carne suína”, responsável pela disseminação da qualidade e saudabilidade desta proteína no mercado consumidor nacional. Segundo o executivo, com o consumo em queda da carne bovina, o setor vê um nicho para trabalhar o crescimento da predileção popular sobre o produto.
No entanto, os últimos tempos foram de desafios para o produtor de suínos. A alta nos custos de produção se tornou cíclica e o setor sofre as consequências dos preços do milho e da soja. “Poucas linhas de crédito disponíveis também dificultaram que o produtor tivesse um maior capital de giro para passar por este momento. O Brasil ainda é carente de políticas públicas e o abastecimento ainda é precário, com baixa capacidade de estocagem de grãos”, critica Nilo de Sá.
As intempéries se estendem ao mercado externo. Atualmente a Rússia representa 35% das exportações de carne suína (1/3 do total), tornando o Brasil diretamente dependente destes embarques. Para o diretor-executivo da ABCS, é fundamental que o País busque outros parceiros, como Japão e Coreia, para que as negociações fiquem menos dependentes de um mercado único.
Brasil e suas extensas particularidades. Com uma nação de território continental, executar o trabalho de forma correta atendendo às especificidades não seria possível sem o apoio de entidades que se espalham por todo o País. Em 16 Estados ficam associações responsáveis por disseminar as ações de sua líder nacional e, ao mesmo tempo, levar a ela as necessidades de produtores. “Sem as associações estaduais e regionais não executamos grande parte das ações que elaboramos. Elas são fundamentais, então é importante para nós que continuem mantendo seus trabalhos, levando aos suinocultores o apoio de que eles necessitam”, comenta o diretor-executivo da ABCS.
Os Estados do Sul lideram a produção nacional. A Pesquisa Pecuária Municipal (IBGE) estima que a região encerrou 2015 com 49% do efetivo nacional, reunindo 19,9 milhões de cabeças. Com 35% do efeitvo do Sul ao final deste mesmo ano, a região Sudeste abriga o segundo maior rebanho do País com sete milhões de cabeças (17% do plantel brasileiro), sendo que Minas Gerais e São Paulo têm os maiores plantéis da região. O terceiro maior rebanho suíno brasileiro encontra-se na região Centro-Oeste, com 6,3 milhões de cabeças e 16% do total nacional.
As regiões Norte e Nordeste do Brasil são as únicas com retração nos rebanhos: a segunda, em 2006, alojava o segundo maior rebanho com 20% do montante total e, agora, representa apenas 14%. No caso do Norte, a queda foi de 6% para 3%. Baixas que se perpetuaram nas vantagens comparativas para a produção em larga escala em outras regiões, assim com o a maior disponibilidade de grãos pelo Brasil. Atualmente, Santa Catarina e Rio Grande do Sul ocupam os dois primeiros lugares do ranking brasileiro de produção de carne suína.
Berço de algumas das mais tradicionais agroindústrias da cadeia de suínos do Brasil, o Estado de Santa Catarina continua a ter nessa atividade a sua principal força econômica do agronegócio. Em termos nacionais, a região responde por cerca de 24% das matrizes alojadas, 33% das granjas existentes e 26% da produção de carne suína do Brasil. SC também destaca-se pelo fornecimento de material genético para todo o País.
A Associação Catarinense de Criadores de Suínos (ACCS, Concórdia/SC) informa que a nutrição é basicamente composta de milho e soja. A maioria dos produtores associados é quem fornece a nutrição (ração pronta) é a empresa integradora, e os demais produtores têm sua nutrição preparada em suas próprias fábricas.
O Estado é o único certificado pela Organização Internacional de Saúde Animal (OIE) como livre de febre aftosa sem vacinação, também certificada internacionalmente como livre de peste suína clássica. “Com tais atributos, Santa Catarina está habilitada para exportar aos mercados mais exigentes”, afirma o presidente da ACCS, Losivanio Luiz de Lorenzi.
Por isso, a sanidade é o principal item de atenção do suinocultor. “Os catarinenses têm dois sistemas de criação de suínos: o sistema de ciclo completo, que agrega todas as fases de produção em uma só propriedade, desde a reprodução, nascimento até o abate. Há também o sistema de criação segregado em múltiplos sítios, onde em uma propriedade é responsável pela unidade produtora de desmamados (UPD) que é onde ocorre o sistema de reprodução e maternidade. Geralmente entre 21 a 28 dias de idade, os leitões são desmamados e vão para outra propriedade que tem o sistema de creche”, explica Lorenzi.
A principal dificuldade do Estado, como aponta o presidente da associação catarinense, é o alto custo de produção, a mão de obra qualificada, a sucessão familiar e a garantia de preço justo para produzir. “A nossa margem de lucro está atrelada ao custo de produção”, complementa. Entre as principais conquistas do setor estadual, além das certificações sanitárias, está a construção da Central de Coleta e Difusão Genética, que garantirá mais produtividade ao suinocultor e resguardará a sanidade do plantel. “Também participamos da formulação da Lei de Integração, que determina direitos e deveres para os produtores integrados e agroindústrias”, diz, citando também a redução do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na venda de animais vivos para outros Estados de 12% para 6%. A medida garante mais competitividade aos suinocultores independentes, que são aqueles que arcam com todos os custos da propriedade.
Para o futuro. “Precisamos nos capacitar todos os dias e buscar informações sobre o mercado junto às entidades representativas. O produtor deve estar atendo às mudanças e ser eficiente dentro da porteira para conseguir atender a demanda do mercado consumidor nacional ou internacional”, finaliza Losivanio Luiz de Lorenzi.
Rio Grande do Sul fica atrás apenas de Santa Catarina na produção de suínos. Entre 2011 e 2016, de acordo com a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA, São Paulo/SP), o volume de carne suína produzida no Estado cresceu 23%, passando de 602 mil toneladas para 738,3 mil toneladas – este foi o maior avanço entre os Estados do Sul. Isso leva a suinocultura gaúcha a responder por 20% da produção nacional.
Os suinocultores são apoiados pela Associação de Criadores de Suínos do Rio Grande do Sul (Acsurs, Estrela/RS). O presidente da entidade, Valdecir Luis Folador, destaca a padronização da atividade, que segue os preceitos gerais do Brasil no que se refere à nutrição, sanidade e manejo. “Temos várias cooperativas que atuam na suinocultura junto a seus associados. No Rio Grande do Sul essa modalidade representa 50% dos produtores, enquanto a outra metade está ligada às agroindústrias”, explica.
Os altos custos de produção também impactaram os suinocultores gaúchos, que encontraram dificuldades para viabilizar a produção. Além disso, Folador cita as intempéries com relação ao mercado externo. “Hoje o RS exporta entre 18% a 20% dos embarques nacionais, e quando não há regularidade para atingir esse número, a mercadoria acaba repassando ao mercado interno, trazendo queda ao preço da carne”, aponta o executivo. No entanto, ele afirma, os produtores estão acostumados a enfrentar desafios. “A qualquer momento eles sabem que pode haver alguma adversidade, seja com relação a mercado, custo de produção etc. Por isso, graças ao trabalho de toda a cadeia, conseguimos manter um excelente status sanitário para evitar problemas que possam colocar em risco a relação do País com mercados externos”, salienta.
A maturidade com relação à profissionalização da porteira pra dentro vem sendo a base para que o consumo de carne suína siga crescendo, já que essa postura do produtor representa um profissionalismo com o alimento. “A carne é cada vez mais exposta de forma positiva, como uma proteína saudável e fundamental para uma alimentação de qualidade”, pontua Folador, que também destaca o marco regulatório da suinocultura brasileira e a criação das câmaras técnicas no Estado, que trouxeram segurança jurídica e atenuaram a relação entre o produtor de suínos e a agroindústria.
Para o futuro. “A suinocultura do Rio Grande do Sul caminha para uma estabilidade, já que o produtor vem seguindo os bons preceitos de produção, meio-ambiente e bem-estar animal. A tendência é que haja maiores produções para cada vez menos produtores, uma vez que a viabilidade econômica e os resultados são maiores para granjas que apostam em produtividade”, conclui Valdecir Luis Folador, ressaltando o objetivo das associações regionais e estaduais: olhar a vivência e necessidades da porteira adentro, mas, também, enxergar a cadeia produtiva como um todo, visualizando questões que possam futuramente trazer prejuízos ou penalizações para o setor como um todo. “Não adianta fazermos o dever de casa se da porteira para fora não vendemos aquilo que produzimos”, finaliza, elucidando o papel do mercado externo no dia a dia do produtor.