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De dona-de-casa à gestora: como um acidente mudou a vida de Cláudia do Val

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Foto: reprodução

Natália Ponse, da redação

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Não há céu sem tempestades. Dizem que a vida é como uma estrada desconhecida em que a gente viaja sem destino certo, sem saber onde e quando essa viagem termina. Para Cláudia do Val esse dito popular é quase que como um roteiro da própria vida. Após sofrer um acidente em 1999, ela perdeu o marido e se viu paraplégica em uma cadeira de rodas. Um trauma emocional intenso e devastador por si só, não fosse um adendo: ela teria que, a partir dali e passando por cima de todo este cenário, administrar a fazenda da família.

O contato com o meio rural desta carioca nunca foi próximo. Nas palavras dela, “de um modo geral, (os cariocas) não têm muita noção sobre o que é uma fazenda e nem mesmo visitaram uma sequer ao longo da vida. Minha visão era muito simplista. Para mim, fazenda era um lugar onde você colocava o gado com um sal mineral no coxo e deixava a natureza fazer o resto (risos)”. Uma visão transformada a duras penas. Hoje, planejamento estratégico, controle de custos, acompanhamento de desempenho e pesquisa/aplicação de tecnologias compatíveis com a realidade da propriedade são parte da rotina desta mulher.

De uma hora para outra, Cláudia agregou às ocupações de dona-de-casa e mãe à posição de empresária. Conduzir as atividades da fazenda nunca havia passado pela cabeça desta mulher, que não viu outra opção senão aprender na escola da vida real o segredo para manejar um empreendimento rural. “Essa decisão ocorreu a princípio pela necessidade de preservar o nosso padrão sócio-econômico de então, com a finalidade de proporcionar uma educação de mais qualidade às minhas filhas e uma vida mais confortável em vários aspectos”, justifica.

Mesmo sem uma visão mais expandida na época, Cláudia do Val tinha consciência que isso não seria possível se vendesse a terra ao invés de fazê-la produzir. Posteriormente, percebeu que era um negócio como um outro qualquer e que se ela se inteirasse melhor sobre seu funcionamento e administrasse bem a parte financeira, poderia enfrentar as contingências diversas, com mais segurança.

Uma estrada corajosa e nada fácil. Foram inúmeras as dificuldades enfrentadas por esta novata no agronegócio. Entre os tantos desafios em seu caminho, estava o de ser mulher. “Tive muito trabalho para ser respeitada em um meio essencialmente masculino e por funcionários que sabiam tudo que eu não sabia”, desabafa Cláudia do Val. Junto a isso identificou problemas com troca frequente de pessoal (que levava a um péssimo desempenho da fazenda); dificuldade de controle, principalmente a nível de avaliação de pastagem e condição corporal dos animais, pelo fato ser cadeirante; problemas diversos como desnutrição do plantel como um todo, índices de prenhez baixíssimos, perdas abundantes com mortes e bezerros desmamando extremamente leves. Também teve que lidar com mão de obra desqualificada e descomprometida, roubos de animais, rações entre outros obstáculos.

O primeiro passo para evitar a falência em um curto espaço de tempo foi a contratação daquele que seria seu braço direito nesta missão. Um gerente que, apesar de entender pouco da atividade, tinha uma ligação com o campo maior do que a de sua gestora e ajudou a impor um pouco mais de respeito à figura da mesma, dentro da propriedade. Depois disso Cláudia do Val passou a fazer cursos e promover encontros com amigos que atuavam na área. Adquirindo conhecimento setorial, contratou zootecnistas e médicos-veterinários para implantar procedimentos de manejo na fazenda, evoluindo gradativamente seu sistema de produção e viabilizando um maior controle e fiscalização dos serviços executados pela equipe. Foi quando investiu em mão de obra mais qualificada, melhorias genéticas com Inseminação Artificial de Tempo Fixo (IATF) e touros melhoradores, nutrição adequada com cada categoria, recuperação na divisão de pastos e a implantação de um completo calendário de vacinação.

De mil cabeças (entre vacas e animais de recria) no passado, Cláudia do Val conquistou o número atual de dois mil e quinhentos animais distribuídos em cria, recria e engorda. Número que é potencializado pela melhoria genética e amplo suporte da fazenda. Foi com garra que esta mulher superou as mazelas que surgiram em sua vida e transformou-as em ladrilho para um caminho de sucesso. “O ensinamento que obtive com toda essa experiência foi que, com determinação, podemos superar os maiores desafios colocados em nosso caminho e, muitas vezes, transformá-los em oportunidades de aprendizado e crescimento em todos os âmbitos”, pontua a empresária.

Em um território vasto como o Brasil, muitas são as viúvas que se veem na posição de liderança dos negócios da família para preservar o patrimômio familiar. Para estas e tantas outras que, por esses ou outros motivos, passem a liderar um empreendimento rural, Cláudia do Val deixa palavras de sabedoria:

  • Não se intimide quando não for devidamente respeitada por não conhecer a atividade como seu antecessor;
  • Existem muitos trabalhadores que não deveriam ter esse nome, pois tudo que não querem é trabalhar. Entretanto, é certo de que você encontrará pessoas sérias e comprometidas com a empresa;
  • Defina com clareza onde quer chegar;
  • Elabore um planejamento estratégico com metas em ordem de prioridade de acordo com a realidade particular de cada uma;
  • Faça contas para tomar decisões e acompanhe o desenvolvimento e os resultados de todas as variáveis envolvidas no processo de produção;
  • Controle é fundamental, todavia, o ingrediente imprescindível chama-se fé. Acreditar no seu próprio potencial é o grande salto para realizar qualquer projeto.

Fé, determinação, força e profissionalismo: características que fizeram de Cláudia do Val o primeiro exemplo a ser mostrado na série de reportagens do portal feed&food em homenagem ao Dia Internacional da Mulher, comemorado em 08 de março, dia único que representa outros 364 de luta intensa da brasileira no agronegócio. A história contada aqui é a de uma pessoa que fez a escalada da montanha da vida, removendo pedras e plantando flores. Ou, adaptando melhor, que abriu caminho na estrada da vida, removendo obstáculos e produzindo alimento para a família brasileira.

Congresso Nacional das Mulheres no Agronegócio. Para ser inspirar por meio dessa e de outras histórias, o evento é direcionado às agricultoras, pecuaristas, produtoras integradas e cooperadas, profissionais da indústria, executivas, mulheres empreendedoras e a todas as profissionais e sucessoras do agronegócio. Um encontro idealizado pelo Transamerica Expo Center, voltado à inovação, rentabilidade, empreendedorismo e sustentabilidade do setor. Em 2017 a reunião será realizada nos dias 17 e 18 de outubro de 2017. Uma oportunidade única de intercâmbio profissional, conhecimento, reciclagem e acesso aos grandes nomes do agronegócio no Brasil.