Natália Ponse, da redação
Insegurança jurídica e crédito dificultado são algumas das mazelas que o produtor brasileiro sofre com a severa burocracia para obtenção da chamada Licença Ambiental Aquícola. Com os crescentes aumentos do custeio, este profissional enfrenta cada vez mais obstáculos para financiar a sua produção. Essa demora pode se estender por até seis anos, impedindo a realização de um planejamento da atividade. Confira as exigências para obtenção da licença ambiental aquícola.
Esta falta de dinheiro, de acordo com o secretário-executivo da Peixe BR (São Paulo/SP), Francisco Medeiros, diminui a velocidade de investimento e crescimento do setor. “Hoje as linhas de crédito existentes têm como pré requisito o licenciamento ambiental e sem ele não é possível liberar recursos”, explica Medeiros. Nesta mesma linha de pensamento, o presidente da Associação Brasileira dos Criadores de Camarão (ABCC, Natal/RN), Itamar Rocha, destaca que o produtor também fica a mercê das fiscalizações do IBAMA/ICMBIO e, por conseguinte, da Polícia Federal e Ministério Público Federal. “Isto não ocorreria com a licença ambiental, onde as fiscalizações são de responsabilidade do respectivo Orgão Licenciador Estadual”, pontua.
A Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA, Brasília/DF) também apoia um melhor sistema para a obtenção da licença. O presidente da Comissão Nacional de Aquicultura da CNA, Eduardo Ono, é uma das personalidades ativas nesta premissa. “As exigências prejudicam porque normalmente partem do pressuposto que a atividade aquícola é causadora de dano ao meio ambiente, o que é um equívoco na nossa visão. É fato que, um manejo produtivo mal feito pode sim levar a algum dano ambiental, mas nesse caso o problema está relacionado ao erro humano e não é intrínseco à atividade, como muitos ambientalista preconizam”, complementa Ono que também cita o “emaranhado” de instrumentos regulatórios a qual a atividade está submetida. Na opinião dele, isso dificulta o processo e abre precedentes para interpretações subjetivas que, às vezes, “passam a ser mais reguladas pela opinião e convicções pessoais de analistas ambientais do que propriamente um regulamento claro e objetivo”.
O resultado disso, ainda nas palavras de Eduardo Ono, são processos burocráticos, morosos e caros ao que os produtores se tornam reféns. Por esta razão, o setor vem se organizando para mobilizar uma revisão nas exigências. A CNA, por exemplo, trabalha junto ao Ministério do Meio Ambiente (MMA, Brasília/DF), IBAMA e CONAMA <(Acho bom escrever por extenso esse) para propor normas mais eficientes e menos burocráticas. Da mesma forma, a confederação vem apoiando as Federações de Agriculturas Estaduais na elaboração de proposições aos órgãos estaduais de meio ambiente na construção de normas específicas para a aquicultura.
A Peixe BR, por sua vez, tem atuado nos Estados para subsidiar os mesmos com informações e interesses do setor produtivo para que haja as alterações necessárias a fim de tornar a legislação aplicável e que possa contribuir para o desenvolvimento de um setor com sustentabilidade. “Com a promulgação de lei complementar 140 que transferiu para os Estados a responsabilidade pelo licenciamento ambiental, cada um administra da forma que acha mais conveniente o setor de piscicultura. Com isso temos Estados com boa legislação e Estados com legislações impossíveis de serem cumpridas”, explica Francisco Medeiros.
O Novo Código Florestal também foi citado por Itamar Rocha, da ABCC. Durante a discussão do código, ele conta que foi possível incluir e aprovar o Capítulo III-A – DO USO ECOLOGICAMENTE SUSTENTÁVEL DOS APICUNS E SALGADOS, cujo Art. 11-A que, em seus diversos sub itens, asseguraram o direito de regularização para os empreendimentos de carcinicultura que haviam sido implantados antes de julho de 2008, inclusive, como atividade agrossilvipastoril, mesmo que tivessem em áreas de APP. “Por iniciativa da ABCC, também foi elaborado um Projeto de Lei para as Assembleias Legislativas Estaduais, em complemento ao Código Florestal, com as particularidades de cada Estado da Federação, o qual já foi aprovado e sancionado pelo Governador do Rio Grande do Norte e pelo Governador do Maranhão”, complementa o presidente da associação.
Para resolver este impasse entre os ambientalistas, o setor produtivo e o governo federal, a primeira ação seria tratar as atividades como integrantes do agronegócio e não como problema ambiental. “Além disso, é preciso criar mecanismos de gestão e licenciamento que gere informações que de fato irão proteger o meio ambiente e proporcionar condições para o crescimento do setor, além de implementar o licenciamento eletrônico simplificado, que transfere para o produtor a responsabilidade pelo licenciamento e pode desafogar o fluxo de trabalho nas secretarias do meio ambiente”, conta o secretário-executivo da Peixe BR. O licenciamento eletrônico também é defendido por Eduardo Ono, já que ficaria a cargo do produtor o envio dos documentos sem necessidade de deslocamento, o que gera altos custos e dispêndio de tempo.
Itamar Rocha, por sua vez, aposta na união entre associações, deputados, governos e federações para contrapor as pressões de órgãos públicos. Ele explica: “sem justificativa se desabona a carcinicultura marinha, formando um posicionamento radicalmente contra a atividade. É preciso levar em conta a contribuição social e econômica dessa atividade, no contexto da geração de emprego e renda e da inclusão social de micro, pequeno e médio produtor da Região Nordeste”.
Burocrático, porém necessário. O atendimento das exigências preconizadas nas licenças ambientais para a produção aquícola é importante no sentido de garantir a sustentabilidade da atividade, considerando os possíveis danos ao meio ambiente. A explicação é da pesquisadora da Embrapa Pesca e Aquicultura (Palmas/TO), Flávia Tavares. De acordo com ela, o produtor pode se preparar para solicitar essa licença e, assim, agilizar o processo. Para isso, é preciso analisar as exigências e identificar quais documentos e ações podem ser antevistas. “Não havendo nenhuma desconformidade ambiental, a SPU irá expedir o ato de autorização de uso e o MAPA informará a decisão ao interessado por intermédio da Superintendência no Estado, onde está prevista a implantação do projeto e por meio do seu endereço eletrônico. Caso o projeto não seja aceito pela SPU/MP devido a inconformidades, o mesmo será restituído pelo MPA ao proponente por meio de expediente contendo a devida justificativa”, explica Tavares.
Na opinião do IBAMA, que responde pelo Ministério do Meio Ambiente neste cenário, estas exigências se estabelecem porque o ambiente aquático demanda uma maior atenção com relação ao impacto de atividades como a piscicultura ou a carcinicultura. “Qualquer problema pode ter uma implicação séria nos córregos. Pode ter um impacto muito grande se não houver um cuidado especial”, conta o coordenador Geral de Transporte, Mineração e Obras Civis, Jonathan Souza da Trindade. Ele completa: “Além disso, o licenciamento envolve a pesca que não é daquela área, uma pesca exótica, que sem o devido cuidado pode ocasionar um problema sério de mortandade por ter outros tipos de peixe que não vivem naturalmente naquele meio. Por isso que a resolução é tão exigente”.
Com relação à demora na obtenção da licença, Trindade cita o alto volume de trabalho nos órgãos ambientais, sejam eles federais ou estaduais. “A questão é ter um número pequeno de servidores para a quantidade de trabalho, por isso o trabalho acaba ficando saturado”, diz. Em razão disso, Trindade acredita que a informatização do sistema (com o licenciamento eletrônico, por exemplo) pode não ser a única solução, é preciso mais. “Além de informatizar é preciso qualificar o corpo técnico e aumentar o número de profissionais para dar conta da demanda”, detalha. Ele também cita as reclamações sobre o atraso, que podem ocorrer porque o empreendedor não cumpre as exigências: “Um estudo ambiental que não está adequado vai precisar de complementações, sendo que o tempo para inserir as mesmas é longo”, exemplifica.