Ciro Rosolem é vice-Presidente do CCAS e Professor Titular da FCA/Unesp
O assunto do momento é o desmatamento. Desmatamento que aumentou. Aumentou? Aumentou em relação a quê, a quando? Na verdade, se for considerado um período de uns 10 anos, os números do desmatamento da Amazônia não parecem tão ruins. Ocorre que, naturalmente, as queimadas aumentam nesta época do ano. É o tempo da seca. Entretanto, algumas perguntas fundamentais não são feitas, e muito menos respondidas. Quanto realmente se queimou? Era mata virgem? Capoeira, pasto? Foi desmatamento legal ou ilegal?
Por fogo em mata, ou cana, ou em pasto, ou até em terreno baldio, é crime neste País, ao contrário do que ocorre em outros cantos do mundo. Então estamos presenciando um fenômeno natural devido à seca, ou um crime de proporções imensas… Ou ambos. Bom, crime é caso de polícia.
Mas o que está ocorrendo na Europa? Vocês se lembram de um incêndio que consumiu boa parte de Portugal, há pouco tempo? Vocês se lembram de um incêndio imenso que destruiu muitas casas na Califórnia? Há outros exemplos. Algum europeu cogitou não comprar mais vinho de Portugal ou pistache da Califórnia? Então, quando é desastre da natureza e quando é crime? Quando deve ser imposto embargo comercial?
Quando eu era garotão tinha muita dor nas canelas. Doía mesmo! Minha avó pedia para ter paciência, porque “crescer dói”. Verdade. Passou. Então, o Brasil se propõe a um acordo comercial sem precedentes com a União Europeia. Então o Brasil recusa esmolas de Noruega e Alemanha. Então o Brasil se resolve colocar no mundo como grande economia que é. Está crescendo, está doendo. Vai doer mais. Seria coincidência, o Sr Macri, em campanha, liderar a onda de protestos contra o Brasil? Seria muito “politicamente incorreto” se levantar contra o acordo comercial que está sendo costurado. Mas é tremendamente popular criticar o desmatamento “inveterado” que vai acabar com a boa vida na Europa. Na verdade, temos elementos para desconfiar que esteja respondendo a pressões internas contra o acordo comercial. Por vias indiretas, e mais populares. Descabida, deselegante no mínimo, a proposição de discutir a Amazônia no G7 sem a presença do Brasil. Interferência na nossa soberania, inaceitável. Agora, até o Papa quer discutir Amazônia.
Muito bem, crescer dói, já dizia vovó. Aliás, consultei um amigo médico recentemente, que me confirmou: dói mesmo.
Temos um Código Florestal que é o mais moderno, o mais restritivo do mundo. Temos quase a totalidade das propriedades rurais cadastradas, via satélite, com suas áreas de preservação demarcadas, o tal do CAR (Cadastro Ambiental Rural). Temos um programa governamental de Agricultura de Baixo Carbono, temos sistemas integrados de lavoura, floresta e pecuária. Ninguém mais tem. Por falar nisso, a maioria dos países da Europa não estão conseguindo cumprir o prometido no protocolo do clima que assinaram. Crescer dói e incomoda. Tira os outros da zona de conforto. A reação da Europa, ameaçando nosso comércio exterior já era esperada. Começou! Sem novidade até aí. Bom, isso tudo não tira a responsabilidade do governo brasileiro em combater firmemente o crime ambiental. Temos as leis, basta que se faça cumprir. Azar que tudo isso esteja ocorrendo logo após o início das discussões sobre o acordo comercial com a Comunidade Europeia. Mas, acreditem, se não fossem as queimadas ou os agrotóxicos, seria outra coisa. A pressão contra o acordo é grande, e governos precisam ser eleitos.
Fonte: Ciro Rosolem.