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Hambúrguer com cara de grife: como o conceito da carne mudou no mercado

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Natália Ponse, da redação

natalia@ciasullieditores.com.br

“Eu gostaria de um x-burguer, por favor!” há algum tempo deu lugar à pergunta “Essa carne é Angus?”. Não poderia ser diferente. Os carrinhos de lanche tão presentes na infância de diferentes gerações, como os Baby Boomers, X e millennials, deram lugar às chamadas hamburguerias. Nesses ambientes o personagem principal é a carne, ou melhor, as carnes.

O mercado de hambúrgueres está no ponto: em 2017, só no ramo de franquias movimentou quase R$ 700 milhões, de acordo com a Associação Brasileira de Franchising. Este ano não deve ser diferente. Somente nesses dois primeiros meses, pelo menos dez novas casas do gênero abriram na cidade do Rio de Janeiro.

De acordo com George Motz, renomado especialista em hambúrguer dos Estados Unidos, a qualidade da carne utilizada e o sabor estão diretamente ligados ao sucesso do estabelecimento. Uma rede de restaurantes fast food conhecida por seus lanches rápidos e simples, por exemplo, também apostou no mercado gourmet. Seu nome? McDonald’s.

Os resultados da rede no primeiro trimestre deste ano superaram as expectativas dos analistas (+ 2,9% ao invés de +2,7%). A força nos mercados internacionais e a opção de consumidores nos EUA por hambúrgueres mais caros ajudaram a impulsionar o desempenho da empresa. O lucro líquido subiu para US$ 1,38 bilhão, ou US$ 1,72 por ação, ante US$ 1,21 bilhão, ou US$ 1,47 por ação, um ano antes.

Um plano de recuperação, lançado pelo presidente-executivo Steve Easterbrook há três anos, trouxe mudanças no menu, novas tecnologias para lojas e renovação de restaurantes para gerar mais tráfego. Um dos pontos positivos foram as vendas dos hambúrgueres gourmet – com alta margem de lucro. Esses produtos oferecem ingredientes frescos e mais caros custam US$ 6 ou US$ 7 nos Estados Unidos, enquanto as opções mais baratas da rede variam de US$ 1 a US$ 3. Com o sucesso da linha premium, o valor médio dos gastos dos consumidores nos EUA aumentou.

Falamos do Angus no início da matéria. Onde foi possível o acesso facilitado e amplo a esse tipo de carne? Pelo próprio McDonal’ds. No Brasil, a responsável pelo fornecimento desse tipo de hambúrguer à rede foi a Associação Brasileira de Angus. “Quando iniciamos o fornecimento para o McDonald’s, ninguém falava em hambúrguer premium no Brasil. Este produto talvez tenha sido o primeiro neste sentido. Há uma visível tendência de sofisticação nas refeições em casa e o hambúrguer segue nesta linha”, conta o executivo da associação, Fábio Medeiros.

A tecnificação da produção, lá dentro da porteira, foi fundamental para o alcance desse sucesso. Com o avanço do emprego da Inseminação Artificial de Tempo Fixo (IATF) foi possível ampliar muito o volume de animais Angus disponíveis para a indústria, permitindo o acesso à carne de qualidade a muitos consumidores. Na sequência, Medeiros conta que houve avanço na implantação de sistemas intensivos de produção, com a utilização de grãos na alimentação, não apenas para substituir a forragem, mas para produzir gordura de cobertura nas carcaças e marmoreio.

Essa mudança permitiu que esta genética passasse a expressar suas melhores características e atingisse níveis de qualidade equivalentes às melhores carnes do mundo. Mas, não existe milagre: sem genética de qualidade, a alimentação não produz qualidade, e vice-versa. “Produzindo nestes níveis de qualidade, permitiu-se aos chefs, churrasqueiros e consumidores se aventurarem em diferentes cortes da carcaça em busca de diferentes sabores e texturas. Foi onde joias como Brisket, Shoulder Steak, Short Ribs, Costela do dianteiro e muitos outros cortes foram descobertos pelo consumidor brasileiro”, complementa o executivo.

Angus em todo o mundo é sinônimo de qualidade. Nos principais países produtores do mundo, o Angus está presente como carne Gourmet, e isso vem sendo comunicado aos consumidores desde 1978, quando iniciou-se nos Estados Unidos o primeiro programa de qualidade Angus do mundo.

Para se ter uma ideia da força deste mercado, no ano passado a associação comercializou cerca de 32 mil toneladas (Equivalente Carcaça) no Brasil, volume expressivo que tem amplo potencial de crescimento. A entidade estima um mercado potencial superior a 200 mil toneladas para a carne angus no Brasil, além do mercado internacional, que demanda de forma incisiva este tipo de produto.

De acordo com Fábio Medeiros, a perspectiva é continuar a trajetória de crescimento. “Temos trabalhado de forma muito árdua utilizando, além de mídias sociais, o fenômeno que chamo de ‘carnivorismo’, materializado pelos constantes e frequentes festivais de churrasco que se espalham por todo o Brasil. Além disso, temos feito um trabalho de aproximação com chefs de cozinha no Brasil e também a promoção internacional, fomentado a imagem do Brasil como uma opção de origem para carne de alta qualidade aos mais exigentes consumidores do mundo”, finaliza.

A valorização da qualidade da principal matéria prima (a carne) levou o sanduíche ao patamar de um prato da alta gastronomia. Com a possibilidade de vários sabores e atendimento de todos os gostos, a agregação de valor ao hambúrguer, seus molhos e demais ingredientes, veio ao encontro da busca por alimentos mais saudáveis e despertou um nicho de oportunidades para novos empreendedores.

“A Unidade de Agronegócios do Sebrae Nacional, tem trabalhado com a iniciativa do Terroir Sebrae, cujo objetivo é a valorização dos produtos diferenciados, com foco em mercados de nicho. Para os interessados em empreender nesse modelo de negócio, a partir da experiência com o Terroir, podemos afirmar que a origem, o saber fazer, a qualidade, e a autenticidade, geram muitas oportunidades de negócios”, cita a analista Técnica da Unidade de Agronegócios (UAGRO) do Sebrae Nacional, Carmen Sousa.

A também analista da unidade, Cláudia Stehling, complementa: “Estudos apontam para a possibilidade de expansão deste modelo de negócio, apesar do grande crescimento observado nos últimos 03 anos, para aqueles que pensam em inovar e prestar um serviço diferenciado o futuro é promissor”, diz e enfatiza: atenção especial deve ser dada a uma gestão profissional do negócio.

Indo além do angus, estabelecimentos transformaram a carne num verdadeiro produto de grife e estilo de vida. A Carnivoria, com unidades em Alphaville (Barueri/SP) e Sorocaba (SP), é um estabelecimento onde é possível não só comer carne, mas escolher a peça in natura que deseja saborear, no local ou em casa. Indo além, eles levantam a bandeira do “Manifesto Carnívoro”, clique aqui para conhecer.

“O público que vem até nós gosta de chegar na gôndola, escolhendo a carne para fazer aqui como se estivesse escolhendo para fazer um churrasco em casa, criando uma cultura”, conta o fundador Henrique Okuda, que toca o negócio junto ao sócio Renato C. Sebastiani, da CowPig, a fornecedora das carnes do local.

Ele conta que, na hora de atender o cliente, a procedência é sempre lembrada. Vai da curiosidade do consumidor: quanto mais informação ele quer, mais ele consegue. “Quebramos o paradigma de que carne especial é só para uma classe AA. O nosso maior feedback é na mesa, quando a pessoa prova o produto, o palato sente o que ele está comendo e ele nota que está comendo algo diferente do que há num prato executivo, por exemplo, em outro restaurante”, conta Okuda.